Habitação com novas medidas: setor divide-se entre aplausos e críticas Enquanto a renda moderada gera polémica, a redução do IVA na construção é elogiada. Imobiliário reage às novidades na habitação. 03 out 2025 min de leitura O novo "plano de choque" do Governo de Montenegro para tentar resolver a crise da habitação em Portugal, aprovado no Conselho de Ministros da semana passada, está a gerar uma série de reações no mercado imobiliário. Os promotores e construtores aplaudem a tão reclamada redução do IVA na construção e a simplificação dos licenciamentos, dois incentivos já muito esperados para aumentar a oferta habitacional. Mas, por outro lado, chovem críticas ao novo conceito de renda moderada com limite até 2.300 euros por mês. E o agravamento do IMT para compradores não residentes também não é visto com bons olhos. Neste artigo preparado pelo idealista/news, fica a saber como é que os players do setor veem estas novas medidas para habitação, cuja aplicação prática terá impacto na vida famílias e nos negócios do imobiliário. Rendas moderadas até 2.300 euros? Setor crítica limite Uma das novas medidas para habitação, apresentadas no renovado Construir Portugal, - e que tem gerado muita polémica - diz respeito à substituição da renda acessível pelo novo conceito de renda moderada, com valores entre os 400 e os 2.300 euros, sem limites municipais. O Governo da AD tem vindo a defender que estes limites do conceito de renda moderada foram definidos para garantir a sua abrangência tanto a nível geográfico (incluindo Lisboa e Porto), bem como dos rendimentos do agregado familiar, chegando às famílias de classe média, que ganham cerca de 5.750 euros mensais. “O nosso plano é este: nós queremos dar vantagens a todo o território", resumiu o primeiro-ministro Luís Montenegro. Apesar das explicações que têm vindo a ser dadas pelo Executivo da direita, não param de chover críticas ao limite superior do conceito de rendas moderadas. “Afirmar que o valor de 2.300 euros é um valor ‘moderado’ é uma ofensa e um ultraje ao povo português e aos inquilinos, atuais e futuros”, sublinhou a Associação dos Inquilinos Lisbonenses (AIL) em comunicado, que considera que estas medidas estão “desfasadas da realidade económica e social dos portugueses”, podendo vir a “acelerar a crise da habitação" no país. Também José Fernandes Martins, advogado e porta-voz da Associação de Inquilinos e Condóminos do Norte de Portugal, afirmou que o conceito de renda moderada “é uma vergonha”. Isto porque a maior parte das famílias portuguesas está longe de conseguir pagar estes valores. “Se o salário médio anda nos 1.000 euros e pouco, como é que se pagam rendas de 2.000 ou 2.300 euros? É impossível”, disse citado pela CNN Portugal. Questionada pelo idealista/news sobre esta e outras novidades no âmbito da habitação, a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) disse ainda não conhecer as medidas e não ter sido ouvida pelo Governo, argumentando assim que "ainda não se pode pronunciar". Redução de IRS para rendas moderadas: sim ou não? Este conceito de rendas moderadas entra, desde logo, na atribuição de um novo incentivo fiscal: os proprietários que coloquem casas para arrendar até 2.300 euros vão ter uma redução da taxa de IRS de 25% para 10%, isto se os contratos de arrendamento tiveram um prazo mínimo de três anos. E já há várias vozes a dizer este limite de rendas com benefícios fiscais vai contribuir para o aumento dos preços das casas para arrendar. Uma delas foi a do secretário-geral do PS, José Luís Carneiro, alertando que esta medida vai “provocar uma subida em espiral" das rendas. Também João Pereira dos Santos, economista e professor no ISEG, admite que este "teto tão alto" pode "criar uma pressão inflacionária para que os preços aumentem, porque as pessoas sabem que podem ir até um certo ponto que ainda beneficiam”, disse ao Expresso. Já o ministro das Infraestruturas e da Habitação de Portugal, Miguel Pinto Luz, garante que o novo conceito de renda moderada não vai contribuir para a especulação imobiliária. Também a economista Vera Gouveia Barros acredita que esta medida não vai inflacionar os preços no arrendamento. O teto máximo da renda moderada que vai ter direito à redução de IRS "não vai levar a que rendas de 1.500 euros passem para 2.300 euros", afirmou à CNN. Por outro lado, a AIL teme que o facto de a redução de IRS para os contratos de arrendamento até 2.300 euros e com duração mínima de três anos vá “incentivar a passagem de contratos de arrendamento de longa duração para contratos de curta duração”, desprotegendo “ainda mais os inquilinos no seu direito à habitação”. Com este incentivo fiscal, o Governo diz que quer “convencer milhares e milhares de proprietários a colocarem novamente os seus imóveis no mercado”, tal como declarou Pinto Luz ao ECO. Mas será que chega? A economista Vera Gouveia Barros considera que estas medidas “podem ser absolutamente ineficazes” nesse sentido, porque não se sabe o motivo pelo qual há mais de 300 mil imóveis vagos em Portugal e fora do mercado. Esta medida não resolve, por exemplo, os conflitos entre herdeiros que deixam as casas sem rumo. Há quem defenda que as várias medidas anunciadas no âmbito do arrendamento são "positivas", desde a redução do IRS para 10% à isenção de AIMI nos arrendamento até 2.300 euros. Esta é a opinião de Luís Menezes Leitão, presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP). Mas, na sua visão, estas medidas "são ainda insuficientes, uma vez que, para devolver credibilidade ao mercado de arrendamento, é necessário revogar aberrações como o adicional ao IMI (...) que só incide sobre prédios de habitação e, por isso, afasta os investidores particulares da habitação", segundo comentou ao idealista/news. Além disso, o presidente da ALP entende que "é preciso revogar todas as leis do arrendamento aprovadas no Governo de António Costa e voltar à lei das rendas de 2012, que foi a única lei que permitiu estimular o mercado de arrendamento". Inquilinos com maior dedução de rendas no IRS – será que chega? Do lado dos inquilinos, o Executivo de Montenegro anunciou somente uma medida de apoio: a dedução das rendas no IRS será de 15% até ao máximo de 900 euros em 2026, passando este limite a 1.000 euros em 2027. Para a AIL, trata-se apenas de “um parco aumento do limite da dedução das rendas para 900 euros em sede de IRS”, que deixa de fora quem não paga IRS, bem como os inquilinos com contratos anteriores a 1990 com rendas atualizadas, que também não podem usá-las nas suas deduções à coleta de IRS. Sobre esta medida, a CGTP questiona: “De que é que serve uma poupança anual no imposto a pagar, quando o dinheiro não chega para pagar a renda a cada final de mês?”. Na perspetiva da intersindical, é preciso alargar o parque público de habitação a preços acessíveis, medidas de controlo do valor das rendas, com a fixação de tetos máximos, bem como a alteração do regime de arrendamento urbano. Ao que tudo indica, não haverá mais apoios aos inquilinos. O Governo não vai limitar a atualização das rendas em 2,24% prevista para 2026, nem apoiar de forma direta os inquilinos que venham a sentir as rendas das casas a subir no próximo ano. Na calha está, sim, uma revisão ao Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) e uma simplificação aos programas de apoio ao arrendamento já existentes (como o Porta 65 ou o apoio extraordinário à renda). Quanto ao uso dos imóveis do Estado destinados a habitação, com gestão privada ou municipal, o Governo anunciou que terão de ter "arrendamentos moderados" (até 2.300 euros mensais). Foto de Polina Tankilevitch no Pexels IVA a 6% na construção de casas é aplaudida No final do Conselho de Ministros que decorreu na quinta-feira da semana passada (dia 25 de setembro), Luís Montenegro anunciou que o Governo vai baixar a taxa de IVA para 6% para a construção de casas para venda até 648 mil euros ou, se forem para arrendamento, com rendas até 2.300 euros - um regime fiscal que irá vigorar até 2029, sendo nesse ano reavaliado. Esta é uma das medidas, que já sofreu avanços e recuos, mas continua a ser muito reclamada pela fileira da construção e imobiliário, sendo defendido que pode ajudar a reduzir os preços das casas. A Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN) aplaudiu a redução do IVA de 23% para 6% na construção e reabilitação, afirmando em comunicado que foi “finalmente acolhida pelo Governo”. A associação liderada por Manuel Reis Campos registou “de forma positiva” as novas medidas para responder a crise da habitação, pedindo que sejam aplicadas de forma “célere e eficaz”. Também a Associação Portuguesa dos Promotores e Investidores Imobiliários (APPII) congratulou “a medida de 6% no IVA para a construção em todo o país, bem como para imóveis de arrendamento”, disse em comunicado Hugo Santos Ferreira, presidente da associação, olhando para este como o início da resolução “do problema sistémico de habitação em Portugal”. E um recente inquérito aos especialistas da construção realizado pela plataforma Fixando revela que a redução do IVA da construção para 6% está a ser recebida com "grande entusiasmo" pelos profissionais do setor. A grande maioria concorda com a medida, admitindo que terá “impacto positivo direto no negócio”, sendo “benéfica para todo o setor da construção”. Dúvidas e críticas sobre o IVA a 6%... Há, no entanto, algumas dúvidas que ainda não foram esclarecidas pelo Governo sobre como será feita a aplicação do IVA a 6%. Será que haverá normas transitórias para os projetos habitacionais em curso? A questão é lançada por João Pinheiro da Silva, sócio de imobiliário da CMS Portugal, que ao canal Now afirmou ser preciso “esperar para ver como o Governo vai tratar os projetos que já estão a ser executados”, alegando que não fará sentido “serem prejudicados” face a outros que ainda não arrancaram. Por outro lado, também há críticas sobre a aplicação do IVA a 6% na construção para casas vendidas até ao valor máximo de 648 mil euros. Ricardo Fernandes, promotor imobiliário e especialista em fiscalidade, comenta ao Expresso que “uma casa de 648 mil euros, mesmo a 30 ou 40 anos, dá uma prestação mensal que é muito acima de um terço daquilo que ganha a média portuguesa”, afirma. Gonçalo Nascimento Rodrigues, coordenador da pós-graduação em investimentos imobiliários do Iscte Executive Education, assume mesmo que com esse "teto tão elevado" para ter IVA 6% "não se gerou, propriamente, um apetite para que a promoção imobiliária derive recursos para segmentos mais baixo". Na sua visão partilhada na página do LinkedIn refere que "o efeito no preço de venda será nulo", arriscando dizer que no curto prazo os preços "tenderão a subir". A par de tudo isso, a equipa executiva de Montenegro aprovou o fim das mais-valias de IRS na venda de imóveis, desde que o valor seja reinvestido em habitação para arrendamento a preços moderados. E também deu luz verde para um novo regime que visa simplificar os licenciamentos, através da redução de prazos e eliminação de entraves burocráticos. Para a AICCOPN esta é uma das medidas que mais vai ajudar a desbloquear o potencial do setor da habitação. Para que estas medidas produzam efeitos no mercado residencial – sobretudo no lado da oferta de casas, dando resposta à alta procura de casas de acordo com as necessidades de quem vive ou investe em Portugal -, a associação liderada por Manuel Reis Campos destaca que tudo depende “da sua execução célere, da clareza nos critérios aplicáveis e da articulação com medidas complementares, como o reforço da construção nova, a aposta na reabilitação urbana e a mobilização do património público e privado para fins habitacionais”. Também a APPII reconhece que é preciso trabalhar com o Governo no sentido da sua implementação rápida “e sem burocracias excessivas”. Foto de AS Photography no Pexels Agravamento do IMT para compradores não residentes cai mal ao setor Há uma medida no novo pacote para a habitação que toca os estrangeiros e que pode ter efeitos na dinâmica dos negócios imobiliários em Portugal. O Governo anunciou que vai agravar o Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) para a compra de habitações por parte de cidadãos não residentes em Portugal, excluindo os emigrantes - à semelhança do que já fizeram outros países com crises de habitação, como por exemplo o Canadá. Na apresentação desta medida, Miguel Pinto Luz garantiu que “Portugal não vai deixar de atrair investimento estrangeiro”, tratando-se de “uma medida de justiça que vai trazer mais equidade e vai redistribuir melhor a riqueza”, rejeitando a atribuição de culpas aos estrangeiros pelo aumento dos preços das casas. Acontece que esta medida não caiu bem junto do setor imobiliário. O presidente da APPII assume que se trata de um “castigo” aos estrangeiros que estão a comprar casas no país, que geralmente são de “valores muito altos”, disse citado pelo Jornal Económico. O mesmo afirmou Patrícia Barão, partner and head of residential da consultora Dils, ao mesmo jornal: “Os estrangeiros compram casas que são o dobro ou o triplo do preço que as famílias portuguesas compram”. Os dados mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE) revelam que os compradores internacionais adquiriram 2.107 casas no segundo trimestre de 2025, correspondendo a 4,9% do total nacional, sendo este o peso mais baixo desde 2021. E o valor médio das casas adquiriras por estrangeiros foi de 391 mil euros, um valor 69% superior face à média das casas compradas pelos portugueses (de 232 mil euros). Foto de Bas Masseus no Pexels A fuga de investidores estrangeiros está entre as principais consequências apontadas pelos profissionais do setor sobre o impacto desta medida - que surge depois do fim dos vistos gold e das restrições ao regime dos Residentes Não Habituais (RNH), levados a cabo pelo Governo socialista de António Costa. “O perigo é exatamente passarmos a mensagem de que o investimento estrangeiro não é bem-vindo a Portugal, que é uma mensagem errada”, concretiza Patrícia Barão, sublinhando que este investimento internacional é “importante”. “A minha sugestão enquanto presidente dos promotores imobiliários e dos investidores é de eliminar esta medida, porque terá um impacto negativo na credibilidade do país a nível internacional”, alertou o presidente da APPII ao mesmo jornal. E Luís Menezes Leitão, da ALP, argumenta mesmo que "se esta medida abranger cidadãos da União Europeia, será considerada incompatível com os Tratados", tal como disse em declarações ao idealista/news. Por seu turno, a Associação Portuguesa de Turismo Residencial e Resorts (APR) defendeu a exclusão de resorts situados em zonas de baixa densidade do agravamento do IMT para não residentes. “Penalizar o investimento estrangeiro em empreendimentos turísticos fora dos centros urbanos, muitas vezes em territórios de baixa densidade, é um erro estratégico que só trará perda de investimento, emprego e receita fiscal para essas regiões”, disse o diretor executivo da APR, Pedro Fontainhas. Afinal, “os resorts turísticos, localizados fora dos centros urbanos, não concorrem com o mercado de primeira habitação para portugueses”, rematou. FONTE.: IDEALISTA/NEWS em: https://www.idealista.pt/news/imobiliario/habitacao/2025/10/02/71841-habitacao-com-novas-medidas-setor-divide-se-entre-aplausos-e-criticas?utm_medium=email&utm_campaign=news_weekly&utm_campaigntype=retention&utm_creation=news_weekly_20251003&utm_date_send=2025-10-0307:30:15&utm_link=m1LeerMasNode71841&utm_project=visitGeneration&utm_recipient_id=62027566580&utm_recipient_list=3&utm_source=newsletters Partilhar artigo FacebookXPinterestWhatsAppCopiar link Link copiado